25 junho 2008

Sobre os guardanapos

Os guardanapos podem dizer muito sobre uma pessoa. A relação do guardanapo com uma pessoa é íntima de tal modo que percebemos suas angústias e potenciais. Enquanto uns torcem aleatoriamente aquele pedaço de papel meio áspero que mais espalha o óleo da batatinha que acaba de comer do que limpa, outro indivíduo torce um mesmo pedaço de papel, suavemente, trazendo aos poucos uma harmoniosa estrutura quase viva de uma pequena flor.

Dobrar, amassar, rasgar, riscar, ensopar com o molho shoyo, há mesmo muitas possibilidades de se deixar denunciar um sentimento que clama pela atenção do próximo ou do longínquo. Quantas vezes esse descartável pedaço de madeira não serviu para aliviar aquela tensão de quem aguarda desesperadamente o pagamento no fim do mês ou da chegada daquele garoto que há tanto prestava atenção e finalmente tiveram a oportunidade para se conhecer?

Quantas vezes o guardanapo não serviu de palco para um rico espetáculo de cores e formas daquele gênio das artes plásticas que ainda busca o reconhecimento no mercado? Quantas vezes ele não guardou aquele beijo encarnado que infelizmente não achou seu alvo por mais um atraso?

Eles passam pelas maiores frustrações e situações de euforia junto aos seus usuários sem serem notados, e denunciam, provam, enredam o caráter da pessoa com uma mínima mancha do molho predileto da pessoa, ou do rabisco esperançoso que grava o telefone para aquela menina que sabe lá deus se o vai guardar.

Ele denuncia a neurose daquele senhor que não acredita no asseio dos empregados daquele restaurante ao mostrar-se completamente picotado e socado no fundo da caneca de chope. Ele dá pistas ao rapaz de que há uma bela e tímida garota a observá-lo voando sutilmente sobre sua face. Ele demonstra o ar infantil e despojado daquele quarentão que ainda olha maravilhado o shoyo subindo pelo guardanapo.

Os guardanapos, com vida útil curta e aparentemente supérflua sabe mais sobre nós, humanos, do que podemos provar. E tudo o que lhes oferecemos é uma boca suja, um resto de comida indesejado, ou uma tosse.Sorte daqueles que são pegos para transformar-se num origami apaixonado de uma mão perfumada.

5 comentários:

Anônimo disse...

o guardanapo tem mil e uma utilidades... e tenho dito!

Anônimo disse...

Mari, valeu! De volta às crônicas. Gostei também da nova apresentação do blog, com Martinha em suas diversas e distintas carinhas. Muito boa. É isso aí! Você esqueceu de falar dos guardanapos de tecido, muito usado antigamente. (pelo menos é o que eu ouvi dizer).
Bjs.

Tasso

Hemeterio disse...

Eu não entendo esse prefixo "guarda". Poxa, se um objeto é um guarda-chuva, ele não retém a chuva, ele a repele. Da mesma forma o guarda-napo. O que é um napo? :-P

Antonio Ximenes disse...

Eu não gostaria de reencarnar em um guardanapo.

Existe sempre a chance de sermos dobrados e transformados em um origami.

Talvez usados para a elaboração improvisada de uns versos apaixonados e que poderão ser guardados em alguma agenda ou diário por décadas.

Mas tamém existe a azarada chance de sermos usados para limpar a sujeira gordurosa de algum caminhoneiro devorador de paneladas... sarrabulho... buchada de bode... ou outras indigestivas refeições.

Podemos ser usados para assoar narizes riníticos... ou até fluidos piores.

Prefiro apenas respeitar a importância desse "mártir" das mesas de bar... e bancadas de cozinha.

Abração pra tu.

Dante Accioly disse...

Nossa! Lindo texto!

Coleção Pingos de Quê - by Magaliana